Um estranho clima se formou nos debates sobre “corrupção” após a manifestação em Brasília no Dia da Pátria (7 de setembro). O apoio de entidades reconhecidamente comprometidas com a ética – como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) – ao protesto que se disseminou por 34 cidades em 17 Estados não impede que se faça um juízo crítico da natureza do evento.
A primeira observação que precisa ser feita refere-se à ausência de entidades com tradição de mobilização popular, como as centrais sindicais e as organizações estudantis. Motivo de manifestações histéricas e raivosas da mídia, que cobrou uma ação como as promovidas contra os governos de Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso (FHC), a não participação dessas entidades é um bom ponto de partida para se entender a essência do pensamento majoritário que moveu os protestos.
Histórica defesa do financiamento público de campanha
O que menos interessa para a mídia e para os movimentos políticos alinhados ao seu ideário é o combate efetivo à corrupção. Um exemplo mais do que evidente são os contantes ataques às propostas de reforma política que propõem medidas concretas para o combate às distorções que fundamentam o que se convencionou chamar de “corrupção”. “Nós, do PT, defendemos o financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, de forma a acabar com a contribuição direta a partidos ou candidatos e a anular a força do poder econômico na eleição”, diz o ex-deputado e ex-minitro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, em recente artigo no jornal Folha de S. Paulo.
O Partido Comunista do Brasil (PCdoB) tem opinião semelhante. Em reunião com o relator da Comissão Especial de Reforma Política, deputado Henrique Fontana (PT-RS), a bancada comunista reafirmou a sua já histórica defesa do financiamento público de campanha. Para o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, a proposta do relator é mais compatível com o nível das preocupações relacionadas com a garantia do financiamento público exclusivo de campanha. “A lógica é certa”, enfatizou ele. “O esforço todo é para garantir o financiamento público”, destacou.
Esse assunto passa ao largo na cantilena da mídia sobre “corrupção”. Quando ele aparece é para ser impiedosamente pisoteado. Qual a razão disso? Ela é de fácil compreensão. Se quisermos levar este debate a sério, devemos lembrar de conceitos políticos há muito desvendados. O Estado é o governo de homens organizados em classes. E a política é a arte de organizar os homens. A vida política, portanto, é o afrontamento dos interesses sociais — ou seja, de classe — pela direção do Estado.
Última contribuição dos "patriotas" de ocasião
Esse não é, portanto, um debate que pode ser elucidado à base do emocinalismo, dando ouvidos a quimeras oportunistas, a caráteres melífluos, a posições dúbias, a meias palavras. Nesse fogaréu que se instalou em Brasília, é preciso ver as coisas que estão além das coisas, enxergar o que há por trás da cortina de fumaça. Tomemos o exemplo da idéia estapafúrdia de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para "investigar a corrupção", a última contribuição dos "patriotas" de ocasião.
É fácil imaginar o redemoinho em que podem se transformar as notícias vazadas com segunda, terceira e quarta intenções no âmbito de uma CPI como essa. Voluntária ou involuntariamente, o máximo que se pode fazer é chantagem política diante do governo. É essa, unicamente, a leitura possível da proposta da CPI. O objetivo é apenas fazer marola para atrapalhar o governo, negociar alguma vantagem para a família e os amigos e nada mais. Não é, nem de longe, estudar a fundo a questão, propor mudanças na legislação e criar os meios para melhorar o combate à corrupção.
A CPI serviria, no máximo, para manipular os incautos com vistas a desgastar a imagem de adversários políticos. A mídia age, em circunstâncias onde há grande disputa pela atenção dos eleitores, como amplificadora das turbulências. Há também os casos onde a ignorância trabalha contra a informação. Seria muito melhor que o Congresso discutisse, a partir de episódios como esses, a natureza da corrupção no Brasil.
Executivo deveria tomar a dianteira dos fatos
Seria útil também que, em vez de apostar em espertezas de resultados políticos duvidosos, os deputados envolvidos nessa manobra se empenhassem em dar agilidade aos trabalhos parlamentares, debatendo a fundo a reforma política. O próprio Executivo deveria sair do imobilismo em que se encontra nessa questão, reorganizar-se internamente, articulando as forças que lhe dão sustentação, e tomar a dianteira dos fatos, de modo a não ser soterrado por eles.
Não há como negar que cada vez mais gente no Brasil vê a política como um gesto pouco nobre. Atribuem-se à sua lógica coisas como a depauperação dos valores e o recrudescimento de instintos primitivos. É comum se ouvir que política é feita pela escória da sociedade. Essa postura está refletida já em nosso léxico. Segundo o Aurélio, alguns dos significados de política são astúcia, ardil, artifício, esperteza. A mídia, por interesses de classe, dá enorme contribuição para isso.
Um marciano de boa índole que tivesse chegado à Terra pelo Brasil e estivesse estudando a humanidade munido do noticiário da mídia certamente anotaria em sua agenda que política é uma das coisas ruins que se inventaram por aqui. A conseqüência disso é a cristalização no território nacional da idéia de que quem não faz política é usurpado, enquanto quem faz leva sempre vantagem, se locupleta.
Histórica concentração de poder político no Brasil
É uma visão erradamente associada ao conceito de poder. Como nunca tivemos por aqui uma democracia de massas, a idéia que se tem é a de que a política serve somente de atalho para a conquista ilícita de uma fatia maior de riquezas. A explicação para essa campanha que tenta vender ao público a antipatia aos "políticos" reside no fato de que as opções de consumo — e aí o leque abrange desde serviços públicos até produtos de tecnologias sofisticadas — têm deixado os brasileiros à mercê de interesses poderosos.
A histórica concentração de poder político no Brasil fez com que a imensa maioria da sociedade vivesse pelo cabresto do poder econômico de poucos. Nessa fase de transição pela qual passa o país, é preciso fazer com que a democracia seja considerada um valor político coletivo. A maioria da sociedade imbuída dessa idéia saberá que exigir direitos, votar e cobrar desempenhos pavimentam o caminho para o avanço das mudanzas. A tarefa das forças democráticas e progressistas é a de livrar o país do manto de fealdade com que a atividade política foi coberta ao longo de nossa história pelo poder da elite.
Ela é longa e penosa, mas necessária. Pela via política, pavimentada com desprendimento e visão estratégica, temos a chance de estabelecer o alargamento da democracia econômica. A idéia do casamento da produção em massa com a distribuição em massa é o norte do projeto desenvolvimentista que começa a ser debatido com força no país. Ao se lançar nessa seara, as forças políticas democráticas e progresistas podem tomar a bandeira da moralidade púbica das mãos conservadoras para empunhá-la com autoridade.
Raízes fundas nas capitanias hereditárias
O bestialógico sobre esse tema consome papel, tinta, espaço na TV e uma quantidade ainda maior (e ainda menos aceitável) de graves reflexões vindas daquilo que se poderia chamar de forças originárias da corrupção. A polêmica se alimenta da aparente incompetência que se apresenta como uma característica irremediável, quase genética, que marca tudo aquilo que a grossa maioria dos "analistas" políticos que freqüentam a mídia comenta. Escrevo aparente incompetência porque no fundo o que há é descarada manipulação ideológica.
Eis uma boa maneira de definir a questão: é que o Brasil tem um sistema político das classes dominantes com raízes fundas nas capitanias hereditárias. Não é difícil perceber os obstáculos enfrentados pelas forças que andam em direção a um modelo de soberania nacional, de uma economia horizontal marcada pelo desenvolvimento. (Cumpre registrar que existe um setor da esquerda que, inexplicavelmente, perde enormes, valiosas quantidades de tempo e de energia enlameando o próprio rosto.)
O sistema político brasileiro estruturado pela ideologia da elite considera a locupletação como parte do seu ról de direitos. Por trás disso, está a lógica da hierarquia que define a sociedade brasileira. Aparece aqui o distanciamento entre establishment e nação, entre elite e povo, como um fertilizante poderoso para a corrupção. O mecanismo degenerador traduz-se na ausência do senso de conjunto, de que todos fazem parte de um mesmo projeto, de um mesmo destino. Aí, vale tudo. Negociar favores, tutano do conceito de corrupção, fica sendo apenas mais uma forma de sobreviver na selva.
Sistema político da elite atenta contra a democracia.
Desde que o quadro partidário brasileiro se modernizou, quando o governo do presidente Getúlio Vargas configurou o cenário político com partidos claramente representando classes ou camadas sociais, há um espaço político de centro-esquerda bem demarcado e com um enorme potencial de crescimento. Neste período, surgiu o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Surgiram também o PSD e a UDN, que retomaram a clássica configuração partidária da República Velha.
O PTB, partido ligado ao movimento operário que adotou uma plataforma nacional e democrática, revelou-se uma força ponderável na formação de um campo político nacional amplo e ao mesmo tempo com base popular, também integrado pelo Partido Comunista do Brasil — então com a sigla PCB —, e cumpriu importante papel até o golpe de 1964.
Hoje, pode-se dizer que, numa conjuntura evidentemente muito mais complexa, o DEM e o PSDB são, em essência, a continuidade do PSD e da UDN. O Partido Comunista do Brasil — com a sigla PCdoB —, que voltou a figurar com destaque no cenário partidário, participa de uma frente popular desde 1989, liderada pelo PT, que se ampliou até a vitória eleitoral de Lula em 2002. Naquele tempo em que reinou a democracia, assim como atualmente, o sistema político estruturado pela elite atentou contra a democracia para impendir a consolidação desse campo tentando empunhar a bandeira da moralidade.
Corrupção é inerente a sistemas políticos burgueses
Independente das projeções que se possa fazer para 2012 e 2014, é preciso constatar que, à medida que os problemas nacionais se complicam, as soluções exigem que país siga pelo rumo das mudanças. Não é possível olhar para o futuro sem enxergar uma dura luta por soluções patrióticas para os problemas nacionais. Ou por outra: os avanços terão curso no processo de luta de classes.
M.P.P.C - MOVIMENTO POPULAR PENSAR CAXIAS
Avenida Pinto Lira, 365 - Engenho do Porto Duque de Caxias - RJ.CEP. 25015-260
CNPJ. 19.374.715/0001-32
Telefone: 55-21-3685-6285 - E-mail: pensarcaxias@hotmail.com
Blog. www.pensarcaxias.com.br
domingo, 11 de setembro de 2011
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário